Melhorando o aplicativo do Banco do Brasil
Como utilizei UX Design para aprimorar a experiência do usuário na utilização do aplicativo de um dos cinco maiores bancos do país.
O desafio
Inicialmente o motivador do projeto foi a preservação da vida e da saúde de idosos em tempos de pandemia, mas constatado que as dificuldades enfrentadas pelos idosos ao utilizar o app eram também sobrecargas aos usuários em geral, busquei aprimorar o app para uso de todos os clientes.
O objetivo do presente artigo é demonstrar detalhadamente como o processo de design de experiência de usuário foi utilizado na resolução do problema apresentado.
Meu papel como UX Designer foi identificar as dificuldades enfrentadas pelos clientes do Banco do Brasil, tornando o aplicativo da instituição simples e fluido, inicialmente evitando deslocamentos desnecessários até agências bancárias, em época de pandemia e por fim, fidelizando usuários em geral em tempos de invasão de fintechs.
Melhorando a experiência do usuário na utilização do app do Banco do Brasil.
O Cenário atual
- Surto de COVID-19 presente no Brasil desde 2019, que até o momento já tirou a vida de 524.000 pessoas (05/07/2021) e a recomendação de distanciamento social da OMS para que as precauções contra a transmissão da COVID-19 sejam mantidas mesmo por quem já estiver vacinado.
- Fintechs -start-ups digitais- que abocanham clientes dos bancos tradicionais, fazendo com que estes acelerem as estratégia de seus braços digitais para não ficar comendo poeira.
Com as restrições da pandemia, o uso dos canais na internet, principalmente via celular, explodiu e chegou a 98% das operações em algumas instituições bancárias tradicionais, que passam a usar as mesmas armas de bancos digitais para atrair clientes que não querem saber de agência, conforme matéria do jornal O Globo.
Já que a chegada das grandes instituições ao campo de batalha digital ainda não conseguiu frear as fintechs (só o Nubank ganhou nos cinco primeiros meses deste ano de 2021, cinco milhões de contas), é a vez dos bancos tradicionais aproveitarem sua solidez e ampliarem seus produtos, facilitando os canais de acesso às suas operações de crédito, seguros e investimento.
Melhorar a experiência do usuário na utilização do aplicativo é ponto chave para consolidar a entrada do Banco do Brasil no cenário já revolucionado pelos bancos digitais.
Objetivos do projeto
1. Incentivar o uso do aplicativo por idosos, evitando deslocamentos desnecessários até agências, preservando vidas.
2. Liberar os funcionários para outras atividades e encerrar agências físicas, diminuindo o custo de operação do Banco.
3. Fidelizar clientes em geral, fazendo inicialmente com que haja crescimento dos investimentos realizados pelos clientes, na ordem de 5% em 12 meses.
A possibilidade de reduzir o quadro de funcionários ou de mantê-los à distância, bem como o crescimento dos investimentos pelos clientes é motivador das melhorias do app.
Usuários
Clientes do Banco do Brasil.
Perfil dos usuários
Editadas após quantitativas (para não descaracterizar os perfis que conduziram às perguntas e deixar claro o raciocínio que levou à raiz do problema).
Mapa da Jornada do usuário Osmar
Utilizando Pixar Storytelling
Era uma vez Sr. Osmar, aposentado e avô do bebê João, prestes a completar um aninho. Com mais de mil quilometros de separação, todos os dias Sr. Osmar acompanhava as aventuras de Joãozinho pelo Instagram, vibrando com suas descobertas.
Um certo dia, ao tomar café e ler seu jornal, costume diário de muitas manhãs, animado com o primeiro aniversário do neto, se deparou com propaganda de loja de brinquedos de madeira, que anunciava ainda que a compra poderia ser realizada por Whatsapp, com ajuda de gentis vendedores.
Por causa disso, e ao ver que a e que a propaganda estava em seu jornal de confiança, animou-se para comprar o presente sem a ajuda de ninguém. Entrou em contato, o vendedor mostrou as opções e ele escolheu um lindo carrinho, pedindo que fosse entregue no dia da comemoração direto na casa do garoto.
O pagamento poderia ser feito por boleto bancário ou Pix, encaminhados pelo Whatsapp. Essa parte foi um pouco mais difícil para Sr. Osmar, que acabou indo até o banco para pagar o boleto, atitude não tão segura em tempos de pandemia. Depois da saga do pagamento, finalmente o presente para o netinho está garantido.
O mapa da Jornada da Usuária Juliana, juntamente com seu descritivo no modelo Pixar Storytelling, realizado após os ajustes das personas, pode ser conferido aqui.
A hora da pesquisa — Primeira etapa de validação
Após criar a primeira versão de proto-persona e proto-jornada do Sr. Osmar, unicamente a partir de hipóteses e conhecimento prévio, listei certezas, suposições e dúvidas na Matriz CSD, e com a Matriz Conhecimento X Impacto foram entendidas quais informações seriam mais relevantes esclarecer.
Matriz CSD
Após os levantamentos realizados, com foco ainda direcionado somente para os usuários com mais de 65 anos, ficou evidente a necessidade de analisar:
- idosos pensam que a utilização de aplicativos bancários os deixa mais expostos a fraudes.
- idosos pensam que apps bancários são confusos.
- idosos utilizariam app se esse transmitisse mais segurança.
- algumas features transmitiriam mais segurança em um app.
Com base nas dúvidas priorizadas, estruturei perguntas direcionadas para idosos, já que as pesquisas quantitativas têm um papel muito importante e não devem ser negligenciadas
Nessa hora o questionário quantitativo entrou em ação e acabou por invalidar, como se verá a seguir, várias das suposições que eu tinha sobre esses usuários.
Pesquisa quantitativa
Criei as perguntas que você por ver aqui, para usuários de aplicativos bancários com mais de 65 anos (não somente do Banco do Brasil), cada uma alinhada a uma suposição ou criada para definir um crivo e segmentar as pessoas apenas para as perguntas que elas saberiam responder.
As suposições que eu gostaria de validar eram:
- A adesão de idosos ao uso de aplicativos bancários é baixa.
- Apps bancários disponíveis atualmente são de difícil utilização.
- A maioria dos idosos pensa que utilizar apps bancários os deixa mais expostos a fraudes.
- Idosos preferem se deslocar até agências físicas.
O próximo passo — Descobertas
As perguntas foram respondidas por 24 idosos e foi interessante ver o questionário em ação e suas possíveis melhorias.
As descobertas que as respostas me trouxeram foram um tanto quanto surpreendentes e me fizeram mudar o foco da solução do problema.
No caso, ao tentar entender o que não estava funcionando bem nos serviços oferecidos via aplicativos bancários, acabei validando que:
- Idosos utilizam aplicativos bancários.
- A maioria dos idosos acham os aplicativos bancários compreensíveis, apesar de não achá-los amigáveis e outra grande parcela os acha fáceis.
- A grande maioria dos idosos não acredita que utilizar apps bancários os deixa mais expostos a fraudes.
- Somente pequena parte dos idosos prefere se deslocar até agências físicas.
Os dados falam por si:
Essas constatações vem de encontro ao que observou Thiago Borsari, diretor de Negócios Digitais do Banco do Brasil, que relatou que o início da prova de vida (exigida pelo INSS para pagar benefícios) por via digital teve alta adesão no BB, mesmo sendo a maioria de clientes idosos.
Ou seja, de nada serviria realizar ajustes no aplicativo do Banco do Brasil focando somente em usuários idosos, uma vez que menos de 1/4 dos usuários idosos considera os aplicativos bancários difíceis.
Ajuste das personas e nova pesquisa quantitativa
A partir dos aprendizados retirados da pesquisa inicial, foram revisados e alterados parte dos artefatos criados anteriormente (personas e jornadas), para que ficassem em conformidade com as respostas adquiridas e passassem a validar novas hipóteses.
Foi aí que criei a persona Juliana e reformei a pesquisa, passando a consultar clientes bancários de todas as idades, validando agora as seguintes hipóteses:
- A imensa maioria das pessoas utiliza aplicativos bancários.
- Apps bancários disponíveis atualmente nos bancos tradicionais são compreensíveis mas não são amigáveis.
- Uma parte dos usuários pensa que utilizar apps bancários os deixa mais expostos a fraudes.
- Ninguém gosta de ir até agências físicas.
Essa reforma busca garantir que sejam priorizadas e prototipadas soluções baseadas em características de usuários reais e não baseados em “eu acho isso” ou “eu acho aquilo”.
A pesquisa reformada abrangendo usuários de todas as idades pode ser vista aqui.
A título de aprendizado, eu observo que teria realizado a pesquisa quantitativa somente com usuários dos ditos bancos tradicionais, tendo eliminado algumas das hipóteses de resposta, melhorando a precisão da pesquisa (comentários precisos acerca das melhorias da pesquisa também estão no link acima).
Tais necessidades de correção e a busca de precisão nas respostas, foram transportadas para a pesquisa qualitativa, que conforme se verá, foi realizada somente com clientes do Banco do Brasil.
Análise da nova pesquisa quantitativa
As perguntas foram respondidas por 48 pessoas e validei que os aplicativos bancários disponíveis atualmente são compreensíveis, mas nem todo mundo os acha amigáveis e que parte significativa dos usuários acredita que usar aplicativo bancário os deixa mais expostos a fraudes.
A conclusão de que 84% dos clientes prefere usar o aplicativo do que ir até uma agência, fica bem próxima do resultado da pesquisa realizada em 2018 com 2000 usuários norte americanos e que aponta que 91% dos usuários (sendo 62% de millenials) preferem usar o aplicativo do que comparecer a agências bancárias.
Pesquisa Qualitativa
Agora que já percebi o que não está funcionando muito bem (maioria das pessoas acha que os aplicativos bancários são pouco amigáveis), chegou a hora de entender porque não funcionam bem.
Para entender melhor alguns pontos, formulei uma pesquisa semi-estruturada, que foi feita através de ligações telefônicas (meio mais acessível para os respondentes e que garantia uma entrevista contextual), respondida por 5 pessoas clientes do Banco do Brasil, utilizando a técnica dois ouvidos e uma boca ou 10% do tempo falando 90% do tempo ouvindo.
Veja aqui como foram elaboradas as perguntas da pesquisa qualitativa.
Aprendizados da pesquisa qualitativa.
- Parte dos entrevistados tem conta no Banco do Brasil pois os pais tinham e abriram para os filhos. Essas pessoas mantêm a conta até hoje por acreditarem na solidez da instituição e por ser um banco com agência em todos os lugares, inclusive no exterior.
- Quando vê logotipos do Uber, Playstation e Ifood dentro do aplicativo, fica com a sensação de propaganda dentro de um serviço que já paga para usar.
- Para resolver coisas no aplicativo do Banco do Brasil é demorado, enquanto na concorrência é muito fácil (Banco do Brasil um dia e concorrência na hora).
- Todos entrevistados citam que usam apenas pagamentos, extratos e saldos e referem que gostam de ver algumas informações logo de cara (saldos e entradas próximas).
- O aplicativo tem letras muito pequenas e de baixa legibilidade.
- Não usa todas as opções que o aplicativo apresenta | aparência de pesado.
- Para fazer investimentos, preferem apps da concorrência.
Com a crescente e inevitável adoção de aplicativos bancários, as ferramentas devem ser repensadas, para que os usuários expandam os benefícios oferecidos pela tecnologia, utilizando ao máximo os serviços oferecidos pela instituição, sem migração para outros bancos.
Pausa para primeiras reflexões
O que se sabe até agora é que os usuários não estão satisfeitos com o aplicativo oferecido atualmente pelo Banco do Brasil, mas é necessário aprofundar os estudos para não tomar decisões somente com os dados apresentados na pesquisa, lembrando que dados sozinhos não se resolvem.
Lealdade Digital
Com base em desk research realizada e que pode ser conferida aqui e dados disponíveis na Apple Store é importante ponderar que:
- Com a disseminação das Fintechs é muito mais fácil comparar os aplicativos dos bancos e comparar as experiências.
- Uma fintech pode não encerrar uma conta num banco tradicional, mas leva uma parcela dos ativos movimentados.
- 48% dos entrevistados trocaria de banco se lessem review positivo acerca de aplicativo bancário (Mobiquity’s 2021 digital banking).
- De acordo com a Apple Store o aplicativo do Banco do Brasil tem nota 4.7 e está em 8º lugar (foram considerados para o ranking os bancos Sicred, BTG, C6, Inter, PagSeguro, Santander, Safra, Banco do Brasil, Itaú, Bradesco, Warren, Nubank e Caixa Economica Federal).
- Na lista de Top Charts, categoria finanças, da mesma Apple Store (aplicativos grátis mais baixados), o Banco do Brasil ocupa 11ª posição.
Priorização da Solução
Agora chegou a hora de verificar quais as oportunidades devem ser priorizadas, lembrando de que escolher o que não fazer é tão importante quanto escolher o que fazer.
Utilizei o método How Might We para entender como poderia aproveitar as oportunidades e conclusões encontradas para priorizar e gerar soluções.
Foram categorizadas as importâncias, em matriz de impacto x esforço, mirando em aumentar o uso do aplicativo pelos clientes e incentivar investimentos.
A lista completa das oportunidades ranqueadas e o suporte das decisões pode ser vista aqui.
Esboço em 4 etapas
Os benefícios de se começar trabalhando no papel podem ser conferidos nesse artigo aqui, que fala sobre como a criação de baixa fidelidade nos permite ir além, ao invés de ficarmos atrelados a uma única ideia.
Benchmarking
Antes do início do desenvolvimento da solução, foi feita análise dos aplicativos do Banco do Brasil e do Nubank, que figura no topo da lista dos aplicativos mais baixados da Apple Store.
Buscou-se apontar as melhorias óbvias que podem acontecer no novo app, focando na empatia com os usuários de todas as idades e em soluções óbvias como tipografia e retirada de informação excessiva.
Aliás, a retirada de informações excessivas e manutenção do menu principal apenas com as funcionalidades mais utilizadas apontadas na pesquisa (extrato, pagamentos, transferência e pix) é corroborada integralmente por inquirição realizada pela Ipsos Forbes em feveiro de 2021:
Analisei também os comentários de usuários na Apple Store e que também são muito úteis para elaboração do nosso protótipo, reforçando que os pontos levantados em nossa pesquisa também são uma percepção dos usuários em geral. Abaixo apenas algumas das observações relevantes:
A pesquisa completa com mais observações e comentários pode ser vista aqui.
Protótipo de baixa fidelidade e Teste de Usabilidade
O teste foi feito através de compartilhamento de tela por Zoom e também por câmeras no Whatsapp que filmaram a tela do computador, com 5 usuários, que foram orientados a pensar alto ao executar as tarefas, no seguinte contexto:
Você tem conta no Banco do Brasil. Com base nisso:
- Faça um pix utilizando o leitor de QR Code.
- Faça uma transferência utilizando sua lista de transferências favoritas.
- Fale com sua gerente pelo Whatsapp.
- Faça um pagamento utilizando boleto bancário que está salvo no seu álbum de fotos.
- Guarde seu dinheiro em LCA.
- Fale com a ouvidoria do Banco do Brasil pelo telefone.
Aprendizados dos testes
- O botão de favoritos e de frequentes não foi facilmente assimilado pelos usuários.
- Conversando com os usuários fez mais sentido organizar a home em três grandes categorias mentais: Quanto tenho | Mover dinheiro | Guardar Dinheiro.
- O fale com a gente também pode ser um botão flutuante que mostra os contatos quando o usuário clica.
Reflexões antes do início dos wireframes
Ao longo da elaboração do projeto e das pesquisas e leituras realizadas, fica evidente que os itens abaixo não podem ficar de fora da elaboração dos wireframes e depois dos protótipos de alta fidelidade:
- Tipografia e cores: Embora designers apreciem minimalismos e espaços em branco, tendência em muitos aplicativos e ainda que a inspiração para a criação do protótipo que será mostrado a seguir tenha sido Dieter Rams conforme essa pesquisa, a tipografia será composta por fontes grandes e contraste forte. O objetivo é favorecer a leitura por idosos e por pessoas que enfrentam deficiências momentâneas (estão em movimento | em pé | luz do sol | segurando sacolas). A fonte pequena do app atual é alvo de reclamação na Apple Store.
- Simplicidade: Redução das opções do menu principal, conforme observações da Apple Store (app confuso e sem informações facilitadas), observando a Lei de Hick, mantendo apenas funcionalidades que usuários mais usam, facilitando a tomada de decisão e diminuindo as chances de erros.
- Espaçamento: Na tela de login o botão outra conta estará afastado do botão de entrar, conforme observação de usuário na Apple Store.
- Eliminação de excessos: Com exceção da tela de splash e login, o logo do Banco do Brasil não é mais mostrado. Usuário sabe onde está e não queremos overbranding. As cores amarelo e azul serão suficientes para caracterizar o “local”.
Wireframe de média fidelidade
Criadas a estrutura das telas no papel, é hora de montar “esqueleto” das telas no Figma. Com esse wireframe é possível agilizar as validações, sem prender-se a refinamentos visuais, o que também facilita as alterações, evitando a sensação de apego do designer e propriedade sobre a obra.